03 out Países ricos acusam o Brasil na OMC
Países ricos acusam o Brasil de ter transformado barreiras temporárias em políticas industriais protecionistas, fazem ameaças e dizem que o País corre sério risco de queda dos investimentos estrangeiros nos próximos anos.
O recado foi dado ontem na Organização Mundial do Comércio (OMC), onde o Brasil escutou uma enxurrada de críticas às barreiras criadas pelo governo de Dilma Rousseff. Europa, Japão, Estados Unidos e Austrália advertem que, embora o Brasil tenha prometido que as barreiras seriam apenas medidas criadas em época de crise, elas começam a se eternizar e poderão vigorar pelo menos até 2017, como no caso do setor automotivo.
O tom da reunião foi dado pela União Europeia. “A atitude do Brasil manda um sinal negativo e deve afetar o fluxo de investimentos diretos ao País”, declarou Bruxelas. As críticas ocorreram na reunião do Comitê de Investimentos da OMC.
Se os países ainda não lançaram disputas nos tribunais da entidade, diplomatas admitem que vão continuar a pressionar o Brasil. “O governo brasileiro adotou uma tendência preocupante e não podemos deixar que se transforme na nova normalidade”, disse a UE.
Um dos assuntos polêmicos foi a redução do IPI dos automóveis. Na avaliação dos países ricos, ao beneficiar empresas com produção nacional, o governo está discriminando bens importados e ferindo regras internacionais. Pior: o que era para ser uma medida temporária em 2011 se transformará em política permanente a partir de 2013, e até 2017.
Para a Europa, o que preocupa não é apenas a lei, mas o fato de ela se transformar em regra para o desenvolvimento do setor automotivo no País. A Austrália não poupou críticas e disse ter “preocupações” diante do que aparenta ser agora uma política permanente de Brasília. Segundo eles, a redução de IPI de 2011 já era irregular.
Para o governo australiano, o novo modelo anunciado em março “mantém as preferências discriminatórias”. “O Brasil havia dito aos países que as medidas seriam temporárias. O acesso está condicionado a estabelecer uma fábrica no Brasil e atender às exigências de conteúdo local. Isso discrimina alguns países e favorece outros”, insistem.
Teles. Outro ponto de atrito é a questão da telefonia móvel e, uma vez mais, o que parecia ser temporário ganha contornos de ser uma nova política industrial protecionista. Washington e Tóquio questionam as exigências do edital de licitação da faixa de frequência de 2,5 GHz – destinada ao serviço de quarta geração da telefonia móvel (4G).
A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) estipulou uma exigência de conteúdo nacional mínimo de 60% para quem quisesse participar de licitações, incluindo equipamentos e sistemas. O leilão marcado para 12 de junho arrecadou R$ 2,9 milhões.
O governo dos EUA deixou clara sua insatisfação com o modelo do leilão e teme que ele continue a ser implementado no País em novas licitações a partir de 2013. A Casa Branca quer saber qual a posição brasileira nos próximos anos em relação à sua política de tecnologia e chega a ironizar o argumento de que o Brasil quer que as operadoras usem “tecnologia brasileira”. “Como é que o governo brasileiro vai determinar o que é essa ‘tecnologia brasileira’?”, questionou a diplomacia americana, em documento enviado ao Itamaraty.
Tóquio atacou na mesma linha e questionou o governo se o mesmo padrão de favorecimento às indústrias nacionais será repetido “quando o Brasil conduzir leilões sobre os direitos de outras frequências”.
“Apesar das preocupações levantadas por países em reuniões anteriores, o Brasil conduziu seu leilão”, disse a delegação japonesa, destacando o fato de que os vencedores tiveram de se comprometer a comprar tecnologia nacional e adotar 70% de produtos nacionais em projetos de infraestrutura nos próximos cinco anos. “Diante dessas circunstâncias, o Japão pede ao Brasil para explicar como essas exigências serão implementadas de forma a não violar os acordos da OMC.”
Fonte: O Estado de S. Paulo – por Jamil Chade / Genebra