06 nov País divulga documento com sugestões para abrir debate sobre câmbio na OMC
O valor do real é uma anomalia, disse ontem, em Genebra, o representante do Brasil na OMC, embaixador Roberto Azevedo, ao apresentar à imprensa internacional a nova iniciativa brasileira para persuadir a OMC a tratar do impacto do desalinhamento cambial sobre o comércio.
Azevedo estima que dificilmente se encontrará valorização de tal magnitude, mostrando um gráfico com a variação cambial desde 1980.
Com a nova contribuição, o Brasil procura impulsionar a discussão entre os 157 países membros da OMC na direção de mecanismos “para ajudar países a lidar com esse tipo de situação” – na prática, pela criação de um instrumento de desafogo para casos de valorização cambial excessiva, que permita a um país impor sobretaxa na importação para proteger a indústria nacional.
O documento submetido pelo Brasil não explicita sua intenção dessa forma, nem propõe um mecanismo já elaborado.
Diplomaticamente, faz um histórico de como o sistema multilateral de comércio tratou até hoje o câmbio, examina os instrumentos de defesa comercial (sobretaxas antidumping, antissubsídios, salvaguardas) nos atuais acordos da OMC e conclui que “são inadequados, dado o grau e o tipo de volatilidade que afetam as moedas no século XXI”.
Para o governo brasileiro, a OMC é mal equipada para tratar dos desafios dos gerados pelos efeitos macro e microeconômicos causados pelas assimetrias nas taxas de câmbio. Sugere uma lista de parâmetros, que podem servir para discutir quais tipos de mecanismos teriam sentido para lidar com desalinhamentos cambiais “significativos e duradouros”.
Entre esses parâmetros, estão a avaliação sobre existência do desalinhamento e sobre qual tipo de gatilho seria autorizado como defesa comercial; o prazo para aplicação da defesa contra importações e sua abrangência – por exemplo, se seriam atingidas as importações de todos os países ou em base seletiva.
Também sugere a discussão da cobertura do mecanismo, se seria aplicado somente a um produtos especifico, ou se cobriria todo um setor ou mesmo todos os setores. Também se deve haver uma investigação prévia para estabelecer a necessidade do mecanismo, levando em conta o grau de distorção cambial e existência do prejuízo, ou se o mecanismo seria automaticamente adotado diante de certas condições.
Outra questão levantada é sobre quem iniciaria uma ação contra o efeito do câmbio no comércio, se setores ou empresas afetadas, ou o governo do país atingido. Para o Brasil, a forte correlação entre movimentos cambiais e o comércio tem sido amplamente demonstrada e reconhecida na literatura especializada e nos debates na própria OMC. “A crescente interconexão dos mercados financeiros e substancial fluidez de fluxos de capital são uma base importante para o comportamento instável, anômalo e, por vezes artificial, de moedas”.
O documento reitera que a OMC não tem a função de tratar de políticas que causam essas oscilações e desalinhamentos, mas considera que se trata da instituição correta para lidar com seu impacto no comércio. Em entrevista com participação de jornalistas dos EUA, China, Índia, Austrália, Espanha e outros países, Azevedo contestou observações de analistas, segundo os quais é possível evitar desalinhamento cambial simplesmente com o país fazendo seu dever de casa. “Isso obviamente não é verdade. Níveis de taxa de câmbio também são influenciados, frequentemente de forma mais vigorosa, por medidas e ações tomadas fora das fronteiras nacionais”, afirmou o embaixador.
Segundo Azevedo, as políticas domésticas são normalmente insuficientes para compensar os efeitos prejudiciais de fatores externos, que desestabilizam sua moeda e conduzem a níveis anômalos e artificiais.
Os países da OMC voltam a discutir câmbio e comércio no fim do mês. De acordo com Azevedo, todas as delegações concordaram em manter o debate e o Brasil tem vários apoios em busca de novo instrumento de defesa comercial.
Fonte: Valor Econômico