O dilema dos importadores

O dilema dos importadores

Com a publicação da Resolução SF nº 13/12, que fixa em 4%, a partir de 1º de janeiro de 2013, a alíquota do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) nas operações interestaduais com mercadorias importadas do exterior, dúvidas cercam os importadores. Apesar de a norma encerrar a chamada guerra fiscal dos portos, na qual Estados concedem benefícios fiscais na importação, a fim de atrair maior volume de negócios para seus portos e aumentar a arrecadação, pode-se dizer que o cenário ainda está longe de alcançar a sonhada segurança jurídica, em razão da divergência nas regras entre Estados e a polêmica interpretação sobre qual alíquota utilizar, na visão do advogado tributarista e consultor de empresas, Carlos Eduardo Garcia Ashikaga.

O especialista recomenda que os importadores levantem as possibilidades, façam cálculos e comparem antes de decidir qual logística dar à operação. Segundo Ashikaga, existe a tendência de que se passe a acumular créditos de ICMS, decorrentes de operações interestaduais com alíquotas muito inferiores àquelas aplicadas na importação, deparando-se, assim, com o primeiro problema que é a limitação para o uso desses valores, que somente pode ocorrer dentro do mesmo Estado.

Além disso, pontua que o procedimento de validação do crédito na Secretaria da Fazenda é burocrático e demorado. Em sua opinião, o governo foi precipitado em não discutir todos os impactos da mudança – que, para ele, fere diversas regras constitucionais, além de acordos internacionais –, num imposto sujeito ao princípio da não cumulatividade e sem considerar todas as consequências da resolução, tanto em termos econômicos, comerciais e logísticos quanto constitucionais, legais e tributários. 

Ashikaga lembra que existem divergências na legislação dos Estados e em relação ao entendimento do local em que é devido o ICMS de importação. “Não saber a regra é o maior problema das operações”, disse o advogado ao citar diferentes decisões no âmbito judicial para situações semelhantes, durante a palestra “Guerra Fiscal de ICMS e as Operações de Comércio Exterior”, promovida pela Aduaneiras. Para o tributarista, a definição do Estado competente em relação ao ICMS – se o do importador, de entrada física ou em que está o destinatário final – é fundamental e tem exigido com frequência o posicionamento do Supremo Tribunal Federal (STF).

Interpretações

De acordo com um Recurso Extraordinário do STF, tem-se que nas importações de bens do exterior “o ICMS é devido ao Estado onde estiver situado o domicílio ou o estabelecimento do destinatário jurídico do bem, pouco importando se o desembaraço ocorreu por meio de ente federativo diverso”.

Nessa linha, o importador é a pessoa responsável pelo “negócio jurídico que subsidiou a operação e trouxe os produtos ao território nacional”. Assim, para uma mercadoria desembaraçada em Santos-SP, com destinatário em Minas Gerais, mas que o importador esteja no Paraná, será devido o ICMS a esse último Estado.

Porém, Ashikaga lembra que também há decisões em favor do Estado destinatário, o que permite concluir que “não há segurança jurídica sobre o que se vai decidir no STF, no Recurso Extraordinário (leading case) que está com repercussão geral e deverá definir o assunto”.

Outra questão analisada pelo advogado é que a diversidade de entendimentos das regulamentações estaduais, bem como a discordância sobre certos benefícios fiscais (glosa de créditos de ICMS em operações sem convênio ou protocolo), abre espaço para que os Estados que se julgarem prejudicados ajuízem uma Ação Direta de Inconstitucionalidade contra tais benefícios. Entretanto, a relevância econômica do tema e a busca pela segurança jurídica levaram o STF a editar uma Proposta de Súmula Vinculante pela qual “qualquer isenção, incentivo, redução de alíquota ou de base de cálculo, crédito presumido, dispensa de pagamento ou outro benefício fiscal relativo ao ICMS, concedido sem prévia aprovação em convênio celebrado no âmbito do Confaz, é inconstitucional”.

Segundo Ashikaga, com a aprovação da Súmula, todos os casos em discussão serão julgados, da mesma forma, ao mesmo tempo, sem deixar alternativas aos contribuintes autuados. Nesse sentido, discute-se no Congresso Nacional a mudança da legislação que exige unanimidade para aprovação de Convênios ICMS no Confaz, “evitando uma catástrofe de proporções nacionais, atingindo não só importadores, mas principalmente a indústria nacional, que também usufrui de benefícios fiscais sem amparo em Convênio”, explica.

Mobilização

O Edital de Proposta de Súmula Vinculante recebeu manifestações contrárias de governos estaduais, sindicatos, federações de comércio e demais entidades setoriais. Segundo Ashikaga, a forma genérica como foi apresentada desagradou o mercado. Na maioria das manifestações, a contestação é o uso do termo “qualquer”, que exclui benefícios e situações especiais. 

A alegação pode ser confirmada ao verificar o texto das petições, como a apresentada pela Federação do Comércio do Distrito Federal, para quem a PSV não prevê exceções, determinando que toda e qualquer isenção ou benefício fiscal necessitará obrigatoriamente de convênio aprovado no Confaz. Para a entidade, a proposta contraria decisões anteriores, “o que somente aumenta a insegurança jurídica”. A CNI também argumenta que a redação é ampla demais, possibilitando eventual choque com a jurisprudência da própria Corte.

Mesmo onde encontra manifestação de apoio, como no Governo do Estado de São Paulo, há sugestão para mudança. No caso paulista, a justificativa é que a redação genérica abrange todas as formas possíveis de benefício.

Resta saber como o mercado irá se adaptar às novas regras e como o Judiciário definirá as questões jurídicas decorrentes das controvérsias geradas pela chamada “guerra fiscal” entre os Estados. “As importações continuarão acontecendo de uma forma ou de outra, mas é uma importante mudança no mercado, que poderá até ser mais benéfica aos contribuintes, desde que estes façam um bom planejamento tributário e uma boa análise de riscos, dentro das novas e complexas regras tributárias”, conclui Ashikaga.

 Fonte: Sem Fronteiras / Por Andréa Campos