Acordo da OMC ‘reforça opção do Brasil pelo multilateralismo’ no comércio global

Acordo da OMC ‘reforça opção do Brasil pelo multilateralismo’ no comércio global

Analistas ouvidos pela BBC Brasil acreditam que a aprovação em Bali, na Indonésia, do chamado Pacote Doha deve reforçar a opção do Brasil por acordos multilaterais para ampliar seus ganhos no comércio internacional.

Segundo eles, o engessamento do Mercosul tem feito o país apostar as fichas em negociações multilaterais. Por isso, mesmo um acordo “light” como o agora fechado na OMC (Organização Mundial do Comércio), equivalente a 10% do que estava previsto na chamada Rodada Doha de liberalização do comércio global, é boa noticia para o país.

“O simples fato de a reunião de Bali terminar com acordo é grande avanço ao Brasil”, diz o professor Antonio Carlos Alves dos Santos, especialista em comércio internacional da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica).

“Países emergentes como o Brasil só têm a ganhar com sobrevivência de organizações como a OMC. No comércio internacional, se há um país do tamanho do Brasil negociando com a União Europeia, o seu poder de fogo será menor do que se houver vários outros países emergentes negociando num fórum e chegando a um consenso. O fórum, assim, reduz poder de fogo dos grandes países e dos grandes blocos econômicos”, diz.

Mercosul

Pelas regras do Mercosul, os países integrantes não podem fazer negociações do gênero bilateralmente. E nem sempre há disposição política no Mercosul para Tratatos de Livre Comércio (TLCs), por causa de condições internas desfavoráveis nos países-membros – como, por exemplo, dificuldades econômicas que favorecem políticas protecionistas.

Em 20 anos, o Mercosul só conseguiu fechar TLCs com o Egito, Israel e a Autoridade Palestina, os três com economias muito pequenas se comparada às aspirações do Brasil no comércio internacional.

A segunda opção para incrementar o fluxo comercial eram justamente os acordos multilaterais. Mas a guinada protecionista do mundo após a crise de 2008 parecia, ter enterrado a Rodada Doha, e o acordo em Bali só saiu após uma maratona de seis dias de difíceis negociações, que haviam gerado expectativas pessimistas.

O acordo na OMC, entretanto, surge em um momento de alento para o Mercosul, como o aparente avanço das negociações para um TLC com a União Europeia.

Nesta semana, os países-membros discutem no Rio de Janeiro a formulação de uma proposta que deve ser levada a Bruxelas.

Mas os avanços mantêm a necessidade de o Brasil fazer uma reflexão sobre o “melhor caminho para seu crescimento econômico” na área do comércio internacional, diz Manuel Garcia, da Faculdade de Economia e Administração da USP (Universidade de São Paulo).

Para ele, “o país está muito voltado ao Mercosul, onde há muito problema com Argentina e Venezuela”.

“Enquanto isso temos a Aliança do Pacífico, com países mais abertos ao comércio exterior. Se o Brasil se aliar a esses países, pode aumentar a eficiência na sua exportação de grãos pelo Pacífico”, diz Garcia.

“O Brasil não pode ficar esperando muito tempo pelo Mercosul, que não tem dado o retorno esperado. O Brasil é um gigante e deveria liderar um acordo do bloco com a Aliança do Pacífico”, diz.

Indústria e agricultura

Ainda não se sabe quanto o pacote significará em dinheiro real na economia brasileira, mas a Confederação Nacional da Indústria (CNI) já comemora o acordo, que “tornará o desembaraço aduaneiro mais rápido e mais barato para o exportador brasilero”, diz nota da entidade.

O volume de compra e venda de mercadorias relativo ao PIB brasileiro foi 20% em 2012, segundo os dados compilados pelo Banco Mundial. Embora o país, no comércio mundial, esteja claramente andando a uma “velocidade” diferente de China, EUA e Alemanha, os empresários brasileiros elogiaram a adoção do acordo na OMC.

“Os empresários terão mais acesso às informações sobre procedimentos de trânsito, taxas e encargos, classificação de mercadorias e restrições de importação antes de chegar com o seu produto no território estrangeiro”, disse em nota à imprensa o diretor de Desenvolvimento Industrial da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Carlos Abijaodi.

Dessa forma, para a CNI, o acordo dará mais “transparência” aos processos de importação e exportação.

Por outro lado, um dos temas mais importantes para o Brasil – a questão dos subsídios impostos por países desenvolvidos a seus exportadores agrícolas – ficou de fora do entendimento.

A reunião em Bali terminou com uma declaração política que incluiu o compromisso de se acabar com esses subsídios, mas sem que fosse definido um prazo para isso.

Avanço na OMC

Primeiro acordo fechado na OMC com a aprovação de todos os 159 países membros, o pacote deixa em aberto os temas mais sensíveis, como o fim dos subsídios agrícolas, tão desejado por emergentes como o Brasil e igualmente rechaçados pela Europa e pelos Estados Unidos.

O acordo simplifica, no entanto, a burocracia do comércio internacional. Os novos procedimentos e harmonização de regras, por si só, devem reduzir pelo menos em 10% os custos do comércio, segundo a OMC.

A presidente Dilma Rousseff disse que o acordo é “amplamente favorável” para o Brasil, porque facilita o acesso dos produtos brasileiros aos mercados do resto do mundo.

O Itamaraty também festejou o pacote, dizendo que “o acordo de Facilitação de Comércio, de grande interesse para o empresariado e para o governo brasileiros, impulsiona reformas que já estão sendo implementadas no país e facilita o acesso de nossos produtos a mercados em todo o mundo, ao simplificar e desburocratizar procedimentos aduaneiros.”

Fonte: BBC Brasil – Por: Maurício Moraes e João Fellet